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A Baixada de Jacarepaguá da primeira metade do Século XX

  • Foto do escritor: IHBAJA
    IHBAJA
  • há 42 minutos
  • 4 min de leitura
Na foto temos uma visão do alto da região da Freguesia em Jacarepaguá
Foto: Douglas Teixeira / Agência Lume.

Por: Leonardo Soares dos Santos.

Professor de História/UFF, pesquisador do IHBAJA e do IAP.

Impressionante o quanto é arraigada a ideia de que as terras da Baixada de Jacarepaguá (e aqui incluo os atuais bairros da Barra da Tijuca, Itanhangá e Recreio dos Bandeirantes) eram abandonadas até mais ou menos meados do Século XX, como se dormisse num sono profundo por séculos, ao que, como num passe de mágica, passasse a ser visto como um novo eldorado, um recanto meio que escondido em pleno Sertão Carioca, que após descoberto por volta dos anos 1940, despertasse inúmeras iniciativas por sua incorporação.


Uma coisa que chama atenção, quando voltamos o nosso olhar ao que era a região nas primeiras décadas do XX, é que mesmo que esparsamente ocupada, já despertava o interesse de figuras de grande poder econômico do contexto social carioca, como agentes do mercado imobiliário e homens de negócios em geral, todos desejosos por fixar suas casas de veraneio ali, distante não mais do que uma hora de suas residências na zona sul da cidade maravilhosa.


Os jornais de época, em especial os classificados imobiliários dos anos 1920 e 1930, já indicam a existência de um vigoroso mercado de terras na região. O parcelamento de antigas fazendas vai dando lugar a criação de centenas de sítios e lotes rurais e urbanos em lugares como Freguesia e Taquara.


É difícil ainda precisar quando exatamente tal interesse se intensificou. É possível que as coisas não tenham se dado dessa maneira: como se num determinado momento, numa data muito bem delimitada, a sociedade carioca passasse a cobiçar as terras de Jacarepaguá.

O mais provável é que tal movimento tenha se articulado de outra forma. De modo mais fragmentado e descontínuo, e até mesmo aleatório.


Um grande empreendimento pensado para o que é hoje o Itanhangá, como o Itanhangá Golf Club, no início dos anos 1930, não teve relação direta com a compra, por parte de Joseph Weslley Finch, de terras que pertenceriam ao Banco de Crédito Móvel, as chamadas glebas A e B e que anos depois dariam origem à localidade de nome Recreio dos Bandeirantes. O mais provável é que um e outro tenha sido movido por uma ideia sobre a região que já começava a ganhar corpo nos anos 1920, e que associava a região de Jacarepaguá a uma espécie de oásis bem perto do coração do então Distrito Federal, imagem essa que seria definitivamente oficializada nas páginas do livro O Sertão Carioca (1936), escrito por Armando Magalhães Correa.


Na imagem vemos a capa do livro O Sertão Carioca de Magalhães Corrêa.
Desenhos a bico de penna que ilustra o livro, de autoria do próprio autor. | Fonte: Acervo Digital da Biblioteca Nacional do Brasil. Disponível em: https://objdigital.bn.br/objdigital2/acervo_digital/div_obrasgerais/drg3817/drg3817.html#page/5/mode/1up

É possível ainda que vários fatores, e não apenas um em especial, tenham favorecido a valorização do lugar. As imagens paradisíacas podem ter reforçado o interesse de setores do mercado imobiliário em investir no lugar, como as obras de saneamento e infraestrutura, por toda a primeira metade do Século XX, podem ter alavancado a incorporação urbana da região.


Na imagem vemos um jornal digitalizado
Reportagem de 1943 do Gazeta de Notícias dando conta de Jacarepaguá como um canteiro de obras.

Há ainda um outro ponto a ser considerado: a diversidade existente no território da Baixada de Jacarepaguá, em termos do histórico de ocupação, características geográficas e estrutura fundiária. Não se tratava de jeito nenhum de um espaço homogêneo. A heterogeneidade era e ainda é a marca desse território. As áreas que hoje conhecemos como Gardênia Azul e Rio das Pedras testemunharam um tipo de estruturação fundiária muito distinto do que viríamos encontrar em boa parte da Barra da Tijuca e Recreio, e que, por sua vez, não era idêntica ao que encontramos na Freguesia e Taquara.


Esses aspectos precisam ser levados em conta se quisermos entender porque houve uma espécie de defasagem em termos de velocidade da incorporação imobiliária entre diferentes porções da Baixada de Jacarepaguá, como visto entre as mais próximas da costa litorânea e os núcleos mais interiorizados.


Mais do que a velocidade, o perfil social que cada área acabou ganhando diferiu acentuadamente, tendo lugares como Barra da Tijuca, Recreio dos Bandeirantes e Itanhangá, sido alvo preferenciais de empreendimentos imobiliários direcionados às classes A e B, e as outras como Anil, Freguesia, Curicica e Gardênia Azul, associadas às classes C e D.


Mas se a região era objeto de desejo e investimento por parte de muita gente poderosa desde as primeiras décadas do Século XX, por que então a ideia de abandono acabou se impondo como dominante nos relatos históricos sobre o lugar? No próximo artigo, retomarei algumas hipóteses a essa questão.

Na imagem vemos a foto de Leonardo Soares, um homem branco de cabelas castanhos escuros, barba estilo cavanhaque e óculos de grau.

Leonardo Soares dos Santos é graduado (2003) em História pela Universidade Federal Fluminense, onde realizou também o seu mestrado (2005) e doutorado (2009) em História Social. Suas pesquisas versam basicamente sobre as relações entre o espaço rural e urbano e suas implicações em termos de políticas públicas e configuração de grupos sociais. Atualmente trabalha como professor e pesquisador no Departamento de Fundamentos da Sociedade do Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento Regional do Polo Universitário da Universidade Fluminense, localizado em Campos dos Goytacazes. É membro-militante do Instituto Histórico da Baixada de Jacarepaguá desde 2010.


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