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"Como pensar em políticas públicas, que de fato, devolvam o rio à comunidade e a comunidade ao rio?"

  • Foto do escritor: Fernanda Calé
    Fernanda Calé
  • há 39 minutos
  • 5 min de leitura
Na imagem podemos ver um rio poluído em uma comunidade
Rio das Pedras trecho próximo as nascentes | Foto: Douglas Teixeira / Agência Lume

Atividade em Rio das Pedras promove aula e passeio às margens do rio que dá nome à comunidade, para debater soluções e reconexão comunitária.

Moradores, estudantes, professores e membros de organizações locais de Rio das Pedras, receberam ontem (26/06) uma imersão profunda na história e nos desafios socioambientais do território. A atividade, parte do projeto "Caminho das Águas - Tour nos Rios de favela", promoveu uma aula aberta e um tour guiado, buscando reconectar a comunidade com seu rio e debater as políticas públicas necessárias para sua recuperação.

A iniciativa, organizada pela Comcat (Comunidades Catalisadoras) através da Rede Favela Sustentável, contou com o apoio do Conexões Rios UFRJ, da Agência Lume e do Ginásio Educacional Tecnológico Mestre Diego Braga. O tour foi guiado pelos geógrafos Adão Castro e Kessy Almeida, ambos integrantes do projeto Conexões Rios UFRJ.


O trajeto se iniciou numa área mais próxima às nascentes do rio, na entrada do condomínio Floresta, e foi encerrado no início da Via Light, próximo à antiga Estação Azul. Durante a caminhada, os geógrafos detalharam a importância histórica do Rio das Pedras antes de sua poluição, bem como os aspectos geográficos do rio e do solo local. A segunda parte da atividade, foi realizada no Ginásio Educacional Tecnológico Mestre Diego Braga, e aprofundou-se na história do abastecimento hídrico na cidade do Rio de Janeiro.

Na foto podemos ver pessoas sentadas em uma sala de aula assistindo a aula.
Adão e Kessy conduzem aula sobre abastecimento hídrico na cidade do Rio. | Foto: Douglas Teixeira / Agência Lume

Kessy Almeida, geógrafa, pesquisadora e uma das integrantes do projeto Conexões Rios da UFRJ, explicou que a iniciativa busca "reconectar a sociedade com os rios, mostrando para eles que o rio não é um valão ou que o rio também tem outras funções, que não só de fornecimento da água, mas que ele também pode ser um local de lazer, de compartilhar com os amigos e reaproximar realmente, eh a sociedade desses rios e poder pensar ele também enquanto um elemento da paisagem".


Para Adão Castro, professor de geografia e pesquisador da UFRJ, o Rio das Pedras é um grande exemplo de como as sociedades foram se distanciando dos rios. Ele defendeu que a atividade busca realizada busca resgatar uma realiadade mais digna para os rios e para a população que convive com eles.


"(...) entender um pouquinho a história do próprio Rio das Pedras, né? E como a população foi se distanciando desse rio, e ao mesmo tempo discutir os problemas ambientais. O Rio das Pedras é um exemplo de como as sociedades, sobretudo a sociedade urbana industrial, foi se distanciando, foi tecnificando os rios, se apropriando e ao mesmo tempo transformando o rio em apenas um condutor de água, de esgoto."


Theresa Williamson, diretora executiva da Comunidades Catalisadoras (Comcat) e da Rede Favela Sustentável, ressaltou que a importância dos rios das favelas que foi um tema recorrente nas conversas do projeto "Memória Climática das Favelas". Theresa afirmou que o objetivo da visita foi entender melhor a importância desse grande rio em uma grande favela importante para o Rio de Janeiro como o caso de Rio das Pedras. "A gente está aqui em Rio das Pedras hoje para entender melhor a importância desse grande rio, de uma grande favela importante para o Rio de Janeiro, para o Brasil, para a gente poder pensar junto um projeto, construir junto um projeto. A gente teve em outras comunidades também ao longo da semana e estamos costurando o projeto projeto coletivo."


Um rio de contrastes
Na imagem podemos ver um rio completamente poluído.
Rio das Pedras na área próximo à Av. Engenheiro Souza Filho. | Foto: Douglas Teixeira / Agência Lume

Durante o percurso, foi possível observar a transformação do Rio das Pedras, que em trechos se assemelha a um condutor de esgoto. Adão Castro explicou que essa mudança está ligada à "realidade socioambiental que essas populações estão vivendo" e à "ausência do papel do Estado, do poder público no ordenamento, no planejamento urbano e ambiental e também na melhoria socioeconômica das pessoas".


Rio das Pedras cresceu e se desenvolveu em um contexto de ausência de política habitacional destinada à população mais pobre. Por isso, há anos a comunidade carece de serviços públicos essenciais, como saneamento básico digno.


Essa falta de serviços é um problema típico das favelas brasileiras, mas em Rio das Pedras, com seu solo instável e encharcado, a situação é agravada, tornando a área suscetível a enchentes e inundações. A retificação e canalização do rio, que visam acelerar o fluxo da água, acabaram intensificando as inundações para áreas de deságue, como a região do Areais, além de impedir a infiltração da água no solo.


Dados divulgados pelo projeto Rio 60ºC, desenvolvido pela Ambiental Mídia com o apoio do Pulitzer Center e do Instituto Serrapilheira, motram que Rio das Pedras possui índices preocupantes relacionados a vulnerabilidade a inundações e deslizamentos.


A Agência Lume teve acesso aos dados diponibilizados pelo projeto que mostram que cerca de 7,07% dos domicílios da comunidade tem vulnerabilidade a inundações 'muito alta', entanto 9,34% tem vulnerabilida alta. Nos casos de vulnerabilidade a deslizamentos, 273 domicílios possuem vulnerabilidade alta. Já os dados sobre vulnerabilidade a chuvas extremas, mostram que 3.186 casas tem vunerabilidade alta e 2.206 tem vulnerabilidade muito alta.

Em comparação, a vizinha Barra da Tijuca apresenta apenas 118 domicílios com alta vulnerabilidade a inundações, e também 118 imóveis com alta vulnerabilidade a chuvas extremas .

A grave situação se reflete na saúde da população, e faz com que a população local precise lidar com a presença de doenças transmitidas pelo contato com água contaminada, como gastrointerites e leptospirose.


Dados preliminares de uma pesquisa desenvolvida pelo Instituto Inpro em parceria com o Laboratório de Limnologia da UFRJ, detectaram níveis intoleráveis de poluição para o ambiente e para a saúde humana.


Na reportagem publicada em dezembro de 2024 pela Agência Lume, o jornalista Felipe Migliani relatou o problema: "Devido aos níveis alarmantes, a análise foi repetida. À medida que o estudo avançava, constatou-se que a poluição aumenta, atingindo seu ponto máximo no cruzamento do rio com a Avenida Engenheiro Souza Filho." Veja a reportagem completa em: https://www.agencialume.com/post/


Memórias e alertas para o futuro
Na foto podemos ver uma roda de pessoas, e no centro dessa roda uma senhora idosa está falando
Maria da Rocha Robadey conta histórias sobre o rio. | Foto: Douglas Teixeira / Agência Lume

Um dos momentos mais tocantes da atividade foi quando o grupo encontrou com Dona Maria da Rocha Robadey. A aposentada de 80 anos, contou como era conviver com o rio antes de sua poluição. "Eu fui criada aqui dentro, dava camarão e peixe. Era água limpa. Não havia comunidade por aqui, não havia nada", recordou Dona Maria. Ela também relembrou como a enchente de 1996 impactou a comunidade, que "acabou com tudo isso levou ponte de ferro e modificou o curso do rio".


A ação em Rio das Pedras reforçou a urgência pela articulação em busca políticas públicas que reconheçam a complexidade socioambiental das favelas e promovam a reconexão das comunidades com seus rios, entendendo-os não apenas como um recurso, mas como um elemento vital da paisagem sociocultural e ecológica

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