Por: Val Costa.
Professor de Geografia e membro do IHBAJA.
“Os pescadores queixam-se do óleo que a lancha deixa à superfície das águas e o barulho da mesma, afugentando os peixes, sem que se tenha obtido uma providência da Capitania dos Portos e da Diretoria da Pesca.” (Armando Magalhães Corrêa)
O trecho acima é do livro “O Sertão Carioca”, do naturalista e pesquisador do Museu Nacional Magalhães Corrêa. Essa publicação reúne uma série de estudos leigos de botânica, geomorfologia e hidrografia sobre a Baixada de Jacarepaguá.
Este fragmento do livro mostra a poluição nas lagoas da Barra da Tijuca provocada pelo lançamento de óleo dos barcos de turistas. O que parece apenas mais uma notícia da acelerada degradação ambiental da nossa região, torna-se ainda mais alarmante quando levamos em consideração que a publicação foi escrita em 1936, bem antes do boom imobiliário da Barra da Tijuca.
Em 1972, a Organização das Nações Unidas (ONU) estabeleceu que o Dia Mundial do Meio Ambiente seria celebrado em 5 de junho de cada ano. No Brasil, o Decreto n° 86.028/1981 instituiu a Semana Nacional do Meio Ambiente, com a finalidade de promover a participação da comunidade nacional na preservação do patrimônio natural do país. Ela ocorre anualmente, entre 1º a 5 de junho.
Infelizmente, não temos o que comemorar na Baixada de Jacarepaguá com relação ao Meio Ambiente. Localizada na região litorânea oeste da cidade do Rio de Janeiro, essa baixada é uma extensa planície flúvio-marinha circundada por dois maciços (Tijuca e Pedra Branca).
Nas bases desses maciços localiza-se a faixa de praia do litoral atlântico. O conjunto lagunar da região é composto pelas lagoas de Marapendi, Tijuca, Camorim, Jacarepaguá e pela Lagoinha das Taxas, possuindo uma área total de drenagem de 280 km².
A partir dos anos 1970, os corpos hídricos da baixada em questão vêm sofrendo profundas mudanças nas suas características, promovidas pela ação humana. O principal problema é o lançamento de esgoto bruto, sobretudo doméstico, nas águas dos rios que deságuam nas lagoas.
Essa grande quantidade de sedimentos e matéria orgânica provoca obstruções que diminuem a correnteza e dificultam muito a renovação da água. A poluição aumenta a quantidade de nitrogênio e de fósforo nos corpos hídricos, contribuindo para a proliferação das cianobactérias, micro-organismos procarióticos capazes de produzir uma toxina que ataca o fígado e o sistema nervoso central.
Esses dejetos, quando descartados inadequadamente em corpos hídricos, podem ser transportados por longas distâncias até encontrarem um ponto de retenção ou seguirem em direção ao oceano, contaminando as águas marinhas.
Rica em biodiversidade, essa região conta com 51 espécies de anfíbios, 24 de répteis, 384 de aves, 91 de mamíferos e 89 de peixes 1. O livro “O Sertão Carioca” já relatava a existência de uma riquíssima fauna nas lagoas da região, sinalizando a presença de garças, socós, maçaricos, marrequinhas, irerês, frangos d’água, tainhas, lambaris, robalos, acarás, bagres e traíras. Infelizmente, hoje muitos só podem ser contemplados nos bicos de pena feitos por Magalhães Corrêa.
Em 2021, após vencer a licitação para operar os serviços de água e esgoto do chamado Bloco 2 (Baixada de Jacarepaguá, Paty do Alferes e Miguel Pereira), a empresa Iguá Saneamento anunciou que iniciaria ainda naquele ano um investimento de R$ 250 milhões na despoluição das águas do complexo lagunar.
Em abril desse ano, finalmente iniciaram os serviços de dragagem e limpeza das lagoas. O objetivo principal é o desassoreamento dos corpos hídricos e o restabelecimento do fluxo de água desse sistema lagunar.
Val Costa é professor de Geografia e Membro do Instituto Histórico da Baixada de Jacarepaguá.
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